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quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Coube-me a mim...

Estávamos as duas no quarto, como tantas outras vezes, até começarmos a ouvir os pais dela a discutir. Estavam prestes a divorciar-se e se a mim, que não era família mas quase, me incomodava, a ela muito mais. Não fez nenhum comentário mas do tanto que lhe conhecia não foi difícil perceber como mudara, ora por tristeza ou cansaço. Como perguntas e conversas eram desnecessárias, fui parva e cómica o quanto mais eu podia, pois quanto mais eu o era mais ela ria. Desse dia, guardamos as fotos mais tresloucadas que alguma vez tiramos e nem tão pouco sei se ela soube exactamente porquê.
Já passaram cerca de seis anos, de uma história que provavelmente mais ninguém sabe, mas que precisei de lembrar. Ela não me pediu nada e se lhe perguntasse se estaria bem ela, com toda a certeza, me diria que sim, mesmo não estando. Não me mentiria por maldade, mas por ser doloroso demais dizer a verdade em voz alta. Então, tomaria o caminho mais simples, como eu poderia também ter tomado e aceitado essa posição. Coube-me a mim, por-me no lugar dela e agir antes mesmo dela gritar, coube-me a mim, perceber que embora ela soubesse com toda a certeza que eu gostava demasiado dela, eu precisava de lho dizer, aparentemente, só porque sim. E disse. Assim como a tirei daquela casa como se nem desse conta, e de onde nunca sairia se assim não fosse. Por vezes, é tão bom quanto necessário aparecer sem ser convidado, pois é isto que se dá em troca da lealdade - compreensão e paciência mesmo quando nem nós nos compreendemos.
Aquelas fotos tresloucadas guardam, quem sabe, algum lição.
C.

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